Eleições Europeias 2024: Primeiras Considerações

 As opiniões expostas neste artigo vinculam exclusivamente os seus autores.

 

Ao longo dos dias 6 a 9 de junho cerca de 185 milhões de eleitores por toda a União Europeia exerceram o seu direito de voto nas eleições para o Parlamento Europeu, tendo sido registado um aumento da participação. Considerando a importância destas eleições e da legislação produzida a nível europeu, este artigo serve o propósito de tecer umas primeiras considerações sobre os resultados das mais recentes eleições europeias.

 

Ao longo dos meses que antecederam estas eleições o grande tema na agenda foi o possível crescimento dos partidos da extrema-direita por toda a Europa. E a verdade é que tanto o grupo Identidade e Democracia (ID), de Marine Le Pen, líder do partido de extrema-direita de França, como os Conservadores e Reformistas (ECR) de Giorgia Meloni, primeira-ministra de Itália, registaram um crescimento nestas eleições. Isto demonstra uma viragem à direita, o que poderá vir a ter um impacto em temas centrais da agenda da UE. 

 

Na França o impacto destes resultados fez-se sentir imediatamente. Após terem sido anunciados os primeiros resultados das eleições pelo Parlamento Europeu, que davam uma clara vitória ao partido de Le Pen, o presidente Emmanuel Macron decidiu dissolver o Parlamento francês e convocar eleições antecipadas para os dias 30 de junho e 7 de julho. Na Alemanha, o terceiro lugar do Partido Social-Democrata (SPD) do chanceler Olaf Scholz, atrás das forças de extrema-direita da Alternativa para a Alemanha (AfD), reforçou a impopularidade da coligação governativa, deixando o chanceler numa posição ainda mais fragilizada. A extrema-direita regista sucesso noutros países como a Bélgica, Hungria, Áustria e Itália. 

 

Apesar disto, não foi uma vitória total das forças da extrema-direita por toda a UE. Um caso especial é que, enquanto houve uma ascensão destas forças políticas em grande da Europa, o mesmo não foi registado nos países nórdicos. Países como a Dinamarca, Suécia e Finlândia contrariaram esta tendência, onde os partidos de centro-esquerda, verdes e europeístas registaram bons desempenhos. 

 

A verdade é que as maiores forças no Parlamento Europeu continuam a ser as forças moderadas do centro político, com o Partido Popular Europeu (PPE), de centro-direita, e os Socialistas e Democratas (S&D), de centro-esquerda, a manter o seu estatuto como os grupos com maior representação parlamentar. O PPE de Ursula von der Leyen (família europeia do Partido Social-Democrata e do CDS) vence as eleições e soma mais catorze assentos parlamentares, enquanto que o S&D (família europeia do Partido Socialista) perde 3 assentos. Em terceiro segue-se o Renovar a Europa, grupo parlamentar das forças liberais europeias, que, apesar de ser a o terceiro maior grupo parlamentar, é também o grupo que perde mais lugares: 22 assentos. O grupo parlamentar dos Verdes sofre também uma derrota pesada, perdendo 19 assentos.

 

Com uma diminuição das forças de esquerda, isto significa que as próximas medidas ambientais poderão ser menos ambiciosas e restritivas. Em contrapartida, o crescimento das forças de direita poderá significar um maior apoio para o setor agrícola e para a indústria, duas das suas grandes bandeiras. Vale a pena ressalvar um ponto no que diz respeito ao apoio prestado à Ucrânia. A nova configuração do Parlamento Europeu poderá representar um entrave a estes apoios, devido ao aumento da influência de grupos da extrema-direita que já mostraram nutrir um certo nível de simpatia por Vladimir Putin.

 

É importante também fazer uma análise dos resultados das eleições europeias em Portugal.  O Partido Socialista (PS) sai como o vencedor das eleições europeias e elege oito eurodeputados, menos um do que em 2019. Marta Temido vence a disputa renhida com a Aliança Democrática (AD), que decidiu arriscar com Sebastião Bugalho. A AD, após vencer as eleições legislativas em março, acaba em segundo lugar, apesar de manter o número de sete eurodeputados em comparação com 2019. O Chega de André Ventura, com Tânger Corrêa em segundo plano, ficou aquém das suas expectativas, que era vencer as eleições europeias. Contudo, o Chega mantém-se como a terceira força política do país, com cerca de 10% dos votos e elegendo pela primeira vez para o Parlamento Europeu, com dois eurodeputados.

 

Um dos grandes vencedores das eleições foi a Iniciativa Liberal (IL), o único partido que conseguiu obter mais votos brutos do que nas legislativas, sendo, ao mesmo tempo, o melhor resultado de sempre do partido em termos absolutos. João Cotrim Figueiredo assegura a estreia da IL no Parlamento Europeu, também com dois eurodeputados. Tanto o Bloco de Esquerda (BE) como a Coligação Democrática Unitária (CDU) conseguiram eleger, embora ambos tenham fica reduzidos a um eurodeputado e perdido votos em relação a 2019, sendo que o BE regista uma queda considerável. O Livre, depois do crescimento significativo nas eleições legislativas, falha a eleição para o Parlamento Europeu, apesar da ambição e esforço de Francisco Paupério. Por fim, o PAN perde o lugar que tinha em Bruxelas, ficando atrás do ADN.

 

Tal como em Portugal, por toda a Europa a direita cresceu, mas as forças do centro prevaleceram. Ursula von der Leyen encontra-se numa posição vantajosa para ser reeleita como Presidente da Comissão Europeia, precisando apenas de apoio do PPE, do S&D e do Renovar a Europa, três forças do centro política que partilham uma visão europeísta, com as suas respetivas diferenças. Apesar disso, ainda requer a nomeação formal por parte do PPE, e a sua apreciação em França já viu melhores dias, sendo que o clima de eleições e instabilidade em França poderá ter implicações.

 

Há também uma oportunidade significativa para uma figura com que os portugueses estão familiarizados, António Costa. O ex-primeiro ministro é um dos principais nomes para suceder ao belga Charles Michel como Presidente do Conselho Europeu, sendo uma figura que reúne apoio em vários países. Com o segundo lugar dos socialistas europeus, a presidência do Conselho Europeu fica mais perto. Além disso, durante a noite eleitoral de 9 de junho, o primeiro-ministro Luís Montenegro deixou claro os contactos que já fez com os diferentes parceiros do PPE para apoiar a candidatura de Costa. Isto significa que António Costa teria apoio dentro das duas principais forças políticas no Parlamento Europeu, deixando o caminho para Bruxelas “mais fácil”. 

 

Agora os deputados recém-eleitos vão formar grupos políticos tendo em conta as suas afinidades políticas. No dia 16 a 19 de julho reúnem-se para a primeira sessão plenária em Estrasburgo, onde o Parlamento vai eleger o seu/sua Presidente, vice-presidentes e questores, bem como decidir sobre o número de deputados que vão integrar cada comissão parlamentar. Os eurodeputados retomam as suas funções, incluindo a análise e alteração de legislação, o escrutínio do trabalho de outras instituições europeias, e o debate sobre questões importantes. Numa fase mais avançada, são formadas as novas composições da Comissão Europeia e do Conselho Europeu.

 

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Referências

 

Abreu, M. (2024, 9 de junho). Macron dissolve a Assembleia na sequência das europeias: legislativas a 30 de junho e Marine Le Pen nunca esteve tão perto da presidência. Expresso. https://expresso.pt/internacional/europa/franca/2024-06-09-macron-dissolve-a-assembleia-na-sequencia-das-europeias-legislativas-a-30-de-junho-e-marine-le-pen-nunca-esteve-tao-perto-da-presidencia-1c6631fa 

 

Caria, C. (2024, 13 de junho). OK, elegemos o Parlamento Europeu, e agora? Expresso. https://expresso.pt/geracao-e/2024-06-13-ok-elegemos-o-parlamento-europeu-e-agora–617dcfc1

 

de Sousa, T. (2024, 11 de junho). António Costa com caminho mais fácil para Bruxelas. Público. https://www.publico.pt/2024/06/11/politica/noticia/antonio-costa-caminho-facil-bruxelas-2093545 

 

European Union. 2024 European election results. https://results.elections.europa.eu/ 

 

Guimarães, M. (2024, 10 de junho). Alemanha: radicais da AfD em segundo, à frente do SPD de Scholz. Público. https://www.publico.pt/2024/06/10/mundo/noticia/alemanha-radicais-afd-segundo-frente-spd-scholz-2093484 

 

Jones, M. (2024, 10 de junho). A Europa vira-se para a direita, mas o centro resiste: o que significam os resultados das eleições europeias e o que se segue. Euronews. https://pt.euronews.com/my-europe/2024/06/10/a-europa-vira-se-para-a-direita-mas-o-centro-resiste-o-que-significam-os-resultados-das-el 

 

Politico. EU Parliament results. https://www.politico.eu/europe-poll-of-polls/european-parliament-election/ 

Miguel Toscano, Licenciado em Relações Internacionais pela Universidade de Évora, Mestrando em
Relações Internacionais pela Universidade de Aalborg

Durante os estudos passou por várias associações estudantis, tendo sido presidente no NERIUE em 2021. Para além disso, profissionalmente já teve experiência nos ramos da investigação e da gestão de projetos. Tem forte interesse em temas das RI como a Governança Global, Estudos de Desenvolvimento e Estudos Ambientais.

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