Conflito Arménia-Azerbaijão

                                                                                                           As opiniões expostas neste artigo vinculam exclusivamente os seus autores.

A recente escalada de tensão no conflito entre a Arménia e o Azerbaijão sobre a região de Nagorno-Karabakh ressuscitou o interesse no mesmo.

Todavia, este conflito não é de todo recente, datando da era soviética. As duas partes interessadas fizeram parte da URSS e, enquanto assim foi, a administração da região foi pacífica. Nos anos 1920, o governo soviético estabeleceu a região autónoma de Nagorno-Karabakh no Azerbaijão. É de notar que a nível internacional, o território é reconhecido como parte integrante do Azerbaijão. O problema desta medida reside no facto de que a maioria da população dessa zona se identificar etnicamente arménia. Após a dissolução da URSS, a região autónoma aprovou a passagem de legislação no sentido de se tornar independente para integrar a Arménia. 
A consequência direta foi o escalar da guerra entre as duas partes sobre o controlo da região, que deixou milhares de refugiados e resultou em 30,000 mortes entre 1991-1994 (Reuters, 2020).

Apenas em 1994 foi possível negociar um cessar-fogo mediado pela Rússia. Deste modo, o conflito permaneceu adormecido durante mais de uma década. No entanto, em Abril de 2016, o conflito implodiu e tanto arménios como azeris experienciaram quatro dias de guerra, após os quais os dois governos anunciaram ter chegado a um novo acordo de cessar-fogo. Infelizmente, múltiplas violações deste acordo prejudicaram as conversações entre as partes, mantendo tensões altas na zona fronteiriça. Mais recentemente, em Julho de 2020, um General Azeri foi morto num confronto, o que conduziu ao desejo de retaliação da população do Azerbaijão. O líder, Ilham Aliyev, que enfrenta uma crise de legitimidade após a queda do preço do petróleo devido à pandemia do vírus Covid-19, procura restaurar a legitimidade do seu governo através do sucesso neste confronto. Desse modo, optou pela tomada de uma posição ofensiva, servindo-se de tecnologia de longo alcance na fronteira.

O resultado desta estratégia foi o avanço territorial para o lado Azeri, com um custo em vidas de vinte pessoas e cerca de 70,000 pessoas deslocadas (Aljazeera, 2020).

Organizações como a OSCE, mais especificamente o Minsk Group, e países como a França, Rússia e Turquia tentaram mediar o conflito de forma a encontrar uma solução permanente, mas nenhum dos lados parece disponível a ceder. No entanto, no passado dia nove de Novembro, houve uma tentativa de pôr termo ao conflito: a Rússia mediou, novamente, um acordo de paz. Este acordo, interrompe, efetivamente, os avanços Azeri. Todavia, a Arménia concede parte do território contestado, claramente entendido como uma vitória para o lado Azeri. Já na Arménia, após o anúncio do governo, a população mostrou o seu descontentamento ao ocupar edifícios do governo e entoar cânticos relativos à traição do governo. Para além disso, Moscovo enviou cerca de 2000 soldados com o objetivo de assegurar o livre-trânsito na estrada que separa a região contestada da Arménia.

Do ponto de vista do panorama internacional, tanto a União Europeia (EU) como os Estados Unidos da América (EUA) urgem a resolução do conflito, todavia, cada vez mais se distanciam do mesmo.

No entanto, a Turquia, um membro da NATO, já expressou o seu apoio pelo lado Azeri, que por sua vez, fornece gás natural a preços acessíveis a Ankara. Por seu lado, a Rússia, numa tentativa de manter em órbita os antigos membros da URSS, concedeu o seu apoio tácito ao lado arménio, correndo-se o risco deste conflito se tornar uma proxy war entre a Rússia e a Turquia, à semelhança do que acontecia na Guerra Fria entre os dois blocos.

Para além disso, o Irão terá algo a perder com este conflito. Entre sanções impostas pelos EUA e a sua intervenção no mundo árabe, Teerão não tem uma posição forte o suficiente para ser considerado um mediador credível para o conflito. Todavia, poderá sofrer repercussões do mesmo, devido à minoria considerável Azeri que compõe o Irão, que poderá comprometer a segurança e estabilidade interna do país. Deste modo, Teerão terá de se contentar com um papel secundário, cabendo o principal à Turquia e à Rússia.
Entre a tentativa de afirmação regional de Ancara, e o segurar das rédeas de Moscovo, que se mostrou essencial em assegurar o novo acordo de paz, o conflito de Nagorno-Karabakh não parece ter resolução permanente à vista, já que se trata de um conflito regional antigo que se encontra emaranhado numa teia de interesses de vários países.

Pessoalmente, considero que acima de todos os interesses energéticos, económicos ou dinâmicas de poder, a atenção deveria ser virada para os milhares de civis que sofrem diariamente com o conflito e as suas consequências, conflito esse que já se tornou mais prejudicial do que o de 1991-1994. Deslocados, feridos ou pior, a população de ambos os países sobrevive aterrorizada sob ameaça permanente do estalar do conflito. Ainda que o panorama geral seja mais complexo que os indivíduos Azeri e Arménios, não devemos ignorar que a sua segurança estará ainda mais comprometida a cada dia que passa sem a resolução do conflito.

Mais recentemente, a mediação russa de um acordo de paz já tardio, constitui uma tentativa de atenuação do confronto. Mesmo assim, a sensação de derrota não passou despercebida na Arménia, o que rapidamente mobilizou a população a mostrar o seu descontentamento com as ações do governo.
Deste modo, arriscaria concluir que este novo acordo de paz não constitui o fim da longa história deste conflito, possivelmente será o fim de apenas um capítulo, dado o visível descontentamento da população arménia face a este novo acordo.

Sara Amorim,

Estudante de Mestrado em Conflict and Development Studies,

Universidade de Gent

Fontes