Como escrever um artigo de investigação

Com a época de exames a chegar, é-nos frequentemente exigido que escrevamos artigos ou ensaios, muitas vezes sem nos ser explicado claramente como proceder. Este artigo descreverá de forma sucinta as etapas básicas deste exercício. No entanto, é importante ter presente que há diversas formas de o fazer, e que esta diversidade não cabe aqui: falaremos apenas do processo mais comum e convencional, sem por isso querer dizer que outros processos de investigação são ‘menos científicos’ ou de alguma forma inferiores.

 

Para começar, um artigo de investigação em Relações Internacionais começa normalmente com uma pergunta sobre algo indeterminado ou que não se conhece, e propõe-se a respondê-la através da análise de material empírico pelas lentes de uma teoria. Isto distingue este processo de outros exercícios científicos igualmente válidos e importantes como, por exemplo, uma revisão de literatura, posicionamento num debate (quer teórico, quer empírico) ou uma recensão crítica. Um ensaio para uma disciplina, quando não especificado, pode assumir em princípio qualquer forma, mas, por limites de espaço, focar-nos-emos no artigo de investigação por ser a principal ou mais comum. Ele percorre essencialmente cinco etapas: pergunta de partida, teoria, recolha de dados, análise de dados e conclusões. Atentemos individualmente a cada um deles.

A pergunta de partida

Um bom artigo de investigação começa com uma pergunta de partida clara e precisa, que deve ser explicitamente enunciada sempre que possível. Mas como chegamos à nossa pergunta de partida em primeiro lugar?

 

Muitas vezes, não sabemos bem o que queremos investigar, ou então de que ângulo abordar nosso tema de interesse, mas isso não tem que ser um problema. A pergunta de partida pode ser ratificada durante o processo de investigação, especialmente depois de precisarmos a nossa teoria, que pode indicar-nos os conceitos mais adequados para utilizar na pergunta (Quivy & Campenhoudt, 1998). No entanto, convém pelo menos saber o tema antes de começarmos. Uma boa pergunta nasce de genuína curiosidade ou interesse que tenhamos, isto é, convém investigarmos algo em que estejamos interessados e, idealmente, tentar responder a algo que não se sabe ou que é indeterminado. Tem pouco interesse colocar uma pergunta de partida a que outros investigadores já tenham respondido de forma convincente – o nosso contributo deve ser avançar o conhecimento científico sobre algo relativamente desconhecido. Para isto, é indispensável ler: só a ler trabalho um volume considerável de trabalho reconhecido sobre a matéria saberemos o que se sabe e o que não se sabe, portanto a nossa forma de contribuir e construir conhecimento em articulação com o que já existe. Ler também ajuda a encontrar ideias e temas sobre o que escrever.

 

Ademais, uma boa pergunta de partida deve:

·       Ser exequível: ser circunscrita a um fenómeno ou conjunto de fenómenos que esteja ao nosso alcance compreender, tendo em conta os nossos limites intelectuais, tempo e recursos (Quivy & Campenhoudt, 1998);

·       Ser clara e precisa: utilizar conceitos e indicadores claramente definidos, ser concisa, unívoca e não deixar margem para dúvidas em relação ao que pretende responder (Quivy & Campenhoudt, 1998);

·       Ser genuína: não se perguntar algo a que não é possível responder objetivamente ou para provar uma posição que já se tinha à partida (ibid.)

·       Ser original: não repetir o que outros já fizeram e incrementar o conhecimento existente na matéria (King, Keohane, & Verba, 1994);

 

Explicitar a pergunta de partida garante que o leitor compreende o que estamos a fazer e ajuda-nos a orientar o processo de investigação, selecionando o que é relevante e poupando tempo. Normalmente, isto é feito na introdução do artigo e, idealmente, a explicitação da pergunta deve ser acompanhada de contexto (dados básicos sobre o assunto investigado) e justificação (o porquê de se ter selecionado aquela pergunta e de ela ser relevante, contrastando com a literatura existente).

A teoria

A teoria funciona como as lentes que utilizamos para observar e compreender o fenómeno. Ela versa normalmente sobre uma parte circunscrita do mundo social e diz-nos para que olhar, apresentando proposições sobre como a realidade funciona prontas para testarmos. Investigar sem teoria é como não ver, na medida em que não sabemos que aspetos priorizar, o que observar, nem temos nenhuma ideia como a realidade funciona que nos permita construir inferências. Mas como selecionar a ‘melhor’ teoria?

 

Uma vez mais, é preciso ler. Normalmente, estamos interessados em estudar um fenómeno, lemos sobre as diversas teorias sobre aquele fenómeno e daí fazemos uma de duas coisas: ou escolhemos aquela que nos parece mais adequada e ilumina os aspetos que queremos analisar, ou, na ausência de uma, combinamos várias. Como sabemos qual é a ‘melhor’ (ou as ‘melhores’) teoria(s)?

 

Uma teoria é um conjunto de proposições logicamente articuladas que visam explicar ou compreender uma parte do mundo social. Esta definição abrangente de teoria aponta-nos para alguns aspetos que vale a pena salientar. Uma teoria é necessariamente abstrata e simplificada porque tenta explicar ou compreender uma classe de fenómenos. A virtude da teoria é as suas proposições generalizadas serem transversais a diferentes acontecimentos empíricos que pertençam à mesma classe de fenómenos – não nos serve uma teoria que só explique um acontecimento específico (Van Evera, 1997). Ademais, a teoria tem proposições claras, justificadas e articuladas entre si. No caso de uma teoria explicativa, uma proposição (neste caso, equivalente a hipótese) tem geralmente a forma de ‘se x acontecer, z sucederá’. Uma boa teoria explicativa terá então um conjunto de proposições claras, prontas para serem testadas em fenómenos empíricos, que estão interligadas entre si de forma lógica, i.e., explicando porque é que é assim (e.g., x leva a z, e z leva a y, porque …). No caso de uma teoria que visa compreender, ela procura mais descobrir significados ou fazer avaliações de cariz normativo do que explicar acontecimentos com leis universais (Hollis, 2003); aqui os critérios são naturalmente diferentes, mas são igualmente importantes proposições gerais (aqui não tanto ‘x leva a y’, mas mais ‘o capitalismo é injusto porque…’) que nos digam o que observar e como apreciar essas observações. O que faz uma boa teoria?

 

·       Poder ‘explicativo’: se é útil e válida para explicar ou compreender os acontecimentos visados, ou, de forma mais geral, se avança conhecimento importante sobre o mundo (Van Evera, 1997);

·       Refutabilidade: tem que ser passível de ser falsificada ou retificada por outros para podermos confiar na sua ‘veracidade’ (Popper, 1989);

·    Parcimónia: usa o menor número de informação (variáveis, conceitos, etc.) para explicar o mais possível sem que implique perder rigor; teoria não pode ser demasiado detalhada porque é, por natureza, generalizadora e abstrata;

·       Clareza e precisão: assenta num conjunto de conceitos, variáveis e hipóteses (se aplicável) que estão claramente definidos e cuja articulação é explicada logicamente.

Tendo em conta este último ponto, a formulação e precisão de conceitos, variáveis hipóteses é fundamental para a construção do enquadramento teórico. De acordo com Goertz (2006), devemos ter atenção a pelo menos três passos ao construir um conceito: (i) capturar a natureza do objeto e enunciar as suas propriedades; (ii) demarcá-lo de outros objetos semelhantes (evitar ‘zonas cinzentas’); (iii) explicar como o medir, idealmente com indicadores e ‘measurement theories(Gilbert, 2001). Um conceito pode ser simultaneamente uma variável, que é simplesmente um conceito que pode assumir vários valores na realidade (Van Evera, 1997). No que toca a variáveis, teorias explicativas contêm pelo menos uma variável independente (causa ou x) e uma variável dependente (efeito ou y). Uma hipótese é uma conjetura de uma relação entre variáveis (‘x causa y’). Uma teoria de cariz explicativo pode ser concebida, de forma simples, como um conjunto de hipóteses logicamente articuladas (Van Evera, 1997), o que implica uma explicação ou justificação para as relações propostas entre conceitos ou variáveis (‘x causa z, que por sua vez causa y porque…’).

 

Por exemplo, queremos propor uma teoria sobre democracia e, de acordo com as nossas leituras, acreditamos que o crescimento económico leva à democratização. O primeiro passo é definir de forma precisa ambos os conceitos e indicar como os medir de forma explícita e clara, justificando a escolha do meio de medição (e.g., crescimento económico = taxa de crescimento do PIB per capita porque…). De seguida, temos que explicar porque é que acreditamos que nesta hipótese, clarificando o mecanismo causal e eventuais sub-hipóteses (e.g., crescimento económico leva à emergência de uma classe de empresários que exigem democracia e financiam este esforço de forma a verem o seu direito à propriedade protegido).

A recolha de dados

Esta etapa inclui dois passos: selecionar os casos que se quer estudar e que dados se quer recolher sobre eles.

A escolha de casos para analisar depende muito do método, tema que trataremos na próxima secção. Por sua vez, isto depende fundamentalmente do objetivo da investigação, explicitado na pergunta de partida. O que nós queremos saber dita que casos escolhemos – não há uma regra universal sobre o melhor método ou a melhor forma de escolher casos. Por exemplo, se queremos entender o crescimento da extrema-direita em Portugal, vamos analisar o caso português; mas, se quisermos explicar o crescimento da extrema-direita na Europa temos que analisar muitos mais casos (ou todos os países europeus, ou uma amostra representativa dos mesmos).

 

Outro aspeto a ter em atenção na escolha de casos é o selection bias – escolha problemática de casos (amostragem não representativa do universo) que distorce os resultados. Este problema é mais facilmente evitado em estudos large-n (muitos casos): basta utilizar amostragem aleatória. No entanto, em estudos small-n (poucos casos) é o investigador a selecionar os casos que estuda e isto abre portas a várias formas de enviesamento, da qual a mais evidente é escolher com base na variável dependente, i.e., escolher casos que corroboram a hipótese que queremos confirmar, deixando de fora aqueles que não o fazem. Para evitar isto, King et al (1994) propõem que não se escolha casos a partir da variável dependente e que se escolham casos que tenham alguma variação na variável dependente. No entanto, escolher com base na variável dependente é necessário para alguns tipos de pergunta, não obstante à regra geralmente ser válida. Em casos de artigos com o propósito de testar uma teoria, os investigadores podem escolher um caso onde o y previsto pela teoria não ocorre apesar de x estar presente para refutar a teoria. Em alternativa, podem também escolher um caso onde y ocorre para tentar mostrar que determinada teoria o consegue explicar ou compreender.

 

A escolha de dados sobre os casos está intimamente ligada à teoria, na medida em que a ela nos indica o que procurar e observar. Os indicadores e das ‘measurement theories’ que construímos para cada conceito e/ou variável dizem-nos como podemos medir o conceito e porque é que ele deve ser medido assim (Gilbert, 2001). Se estabeleci que para ‘crescimento económico’ (x) vou utilizar o indicador ‘taxa de crescimento do PIB per capita’, sei que tenho de recolher este valor para todos os casos que selecionai. Explicitar estes dois elementos é fundamental para a recolha de dados: não só para orientar o investigador em relação ao que deve recolher, mas também para o leitor poder avaliar e reproduzir o exercício científico. Ademais, os indicadores devem possuir duas qualidades (Gilbert, 2001; King et al., 1994):

·       Validade: medir corretamente o conceito que quer medir ou, dito de outra forma, ser uma medida que represente bem a natureza do conceito;

·       Confiabilidade: utilizar uma forma de medir que produza resultados consistentes em diferentes medições (desde que o objeto não mude).

 

Aqui, como em todas as etapas, a transparência é chave, devendo-se explicitar todo o processo (definição de conceitos e variáveis, escolha e justificação de indicadores) para que o exercício científico possa ser refutado ou replicado por pares; a posse destas duas qualidades é de suma importância para bom trabalho científico.

 

Algumas formas de recolha de dados na prática, consideradas mais a fundo na próxima secção por estarem muitas vezes interligadas com formas de análise, são observação direta, entrevistas, inquéritos, análise de conteúdo (fontes primárias), revisão de literatura (fontes secundárias), análise estatística, inter alia

A análise dos dados

Para analisar os dados sobre os casos que escolhemos e daí extrair inferências científicas recorremos a métodos. Uma vez mais, não há métodos melhores que outros; os métodos são mais ou menos adequados em função daquilo que se quer saber, indicado pela pergunta de partida (ver exemplo na secção anterior). Mas como sabemos qual o método mais adequado para responder à nossa pergunta?

 

Quem investiga confronta-se com três opções: métodos qualitativos, quantitativos ou métodos mistos (combinação de ambos).

 

Métodos qualitativos geralmente procuram explicar ou compreender um resultado (y) num número pequeno de casos, considerando-os em detalhe e profundidade, olhando para múltiplas variáveis, e tomando uma noção de causalidade mais exigente (x como condição necessária e suficiente) e complexa (múltiplas causas e combinações) (Mahoney & Goertz, 2006). Normalmente, implica um contacto mais próximo com o objeto de estudo e pretende capturar experiências e significados subjetivos ou intersubjetivos (Creswell & Creswell, 2018). Algumas opções de métodos à disposição de quem investigador são:

·       Observação direta: observar o fenómeno no caso, no local e recolher dados; permite contacto próximo com participantes e eventos, logo conhecimento detalhado, mas é toldado pela subjetividade e capacidades de quem observa (Creswell & Creswell, 2018);

·       Entrevistas aprofundadas para capturar em detalhe experiências ou significados que pessoas ou grupos atribuem a um fenómeno (Quivy & Campenhoudt, 1998);

·       Análise de conteúdo (documentos oficiais, atas de reuniões, discursos, …): permite capturar os significados que os participantes atribuem a eventos e reconstituir a sua subjetividade, mas pode ser difícil de aceder, processar (softwares de computador ajudam) e também saber se o que os participantes reportam é honesto (Creswell & Creswell, 2018);

·       Estudos de caso: investigação de um ou pequeno número de casos que são instâncias de uma classe de fenómenos que interessa ao investigador; permite explicar acontecimentos históricos contingentes com rigor e atender a causalidade múltipla, podendo também servir para testar teorias existentes ou gerar hipóteses teóricas novas; o problema é que é difícil generalizar para além dos casos estudados e há perigo de selection bias; algumas técnicas disponíveis incluem process tracing e congruence testing (Bennett, 2004);

·       Comparação: ao comparar vários casos reproduzimos o método experimental no sentido em que controlamos fatores que não provocam efeito e detetamos padrões e regularidades transversais a todos os casos que podem explicar esse efeito; alguns métodos disponíveis são os métodos da semelhança, da diferença e o indireto da diferença (métodos de Mill) e a qualitative comparative analysis (Ragin, 1994).

 

No geral, os métodos qualitativos têm vantagens como a profundidade do conhecimento sobre o objeto, contacto com participantes, estabelecimento de causalidade mais rigoroso e complexo, mas, por outro lado, os dados têm menos confiabilidade porque não são muitas vezes quantitativos nem objetivamente mensuráveis, o resultado está mais vulnerável à subjetividade de quem investiga, e é difícil generalizar para além dos casos estudados.

Os métodos quantitativos não se focam em casos particulares; focam-se, em alternativa, em variáveis, procurando perceber qual é o seu efeito numa população: trabalham, por isso, com grande número de casos (large-n) (Mahoney & Goertz, 2006). O procedimento é geralmente gerar hipóteses sobre uma relação entre x (um ou vários) e y, colecionar valores destas variáveis na população, ou numa amostra representativa, e depois testar a associação das variáveis. Trabalha com variáveis, com dados objetivos e mensuráveis (normalmente variáveis quantitativas e contínuas) e procura fazer inferências sobre a população, não sobre um pequeno número de casos. É adequado quando queremos perceber associações, explicações ou ‘leis’ universais.

 

Dispensa selection bias devido à amostragem aleatória, há grande confiabilidade na recolha e medição de dados (geralmente é transparente e replicável), e permite trabalhar com grande número de casos e fazer inferências sobre a população. Alguns problemas incluem a dificuldade de estabelecer causalidade (só porque dois fenómenos variam em conjunto, não quer dizer que um causa o outro), problemas de validade (indicador representa de forma simplista o que a variável significa), inadequação para explicar fenómenos complexos (nem tudo pode ser exprimido por indicadores quantitativos) e com múltiplas combinações causais (Quivy & Campenhoudt, 1998). Alguns argumentam que o primeiro problema é minorado por técnicas estatísticas que estabelecem se o efeito ocorre por aleatoriedade ou não (Braumoeller & Sartori, 2004).

 

Como se procede? É definida a população ou amostra a estudar e o que se quer saber. Os dados são recolhidos por inquéritos, experiências, ou bases de dados existentes. Depois, conduz-se a análise estatística dos dados através da lógica acima descrita, sendo utilizadas várias técnicas em função do objetivo do estudo: medidas de tendência central (moda, mediana, média), de dispersão (quartis, variância, desvio padrão), t-tests e ANOVA tests (comparar médias de grupos ou diferentes amostras), correlações e regressões (associações entre duas ou mais variáveis) (ver Field et al., 2012).

 

Métodos mistos combinam técnicas de ambos e são cada vez mais utilizados. Um exemplo pode ser quando queremos saber o que causa determinado fenómeno, mas não temos ideia de quais podem ser as variáveis independentes. Assim, fazemos um estudo de caso para perceber o que causa determinado resultado num caso isolado; concebemos uma hipótese causal com base neste estudo e tentamos ver se se aplica a todos os casos; traduzimos para variáveis, medimos na população e procuramos associação estatística.

 

Assim, concluímos que a escolha de método de análise depende essencialmente do nosso objetivo de investigação. Retomemos o exemplo da secção anterior em que tínhamos dois projetos de investigação – um que queria explicar o crescimento da extrema-direita em Portugal e outro na Europa. No primeiro caso, um estudo de caso qualitativo será mais apropriado, que olhe em detalhe para o caso português e teste um conjunto de hipóteses teóricas abstraídas de outros casos, por exemplo. No segundo caso, uma análise estatística de regressão será mais adequada, que teste a associação entre certas variáveis independentes indicadas por teoria e a emergência de partidos de extrema-direita num conjunto alargado de casos (amostra representativa ou população da Europa). Aqui vemos que existe uma relação entre os casos que escolhemos e a possibilidade de generalizar as nossas conclusões. Geralmente, não podemos inferir leis teóricas universais (que se aplicam a todos os casos) com base em poucos casos, ou numa amostra que não seja representativa da população. Isto torna as generalizações que fazemos com base em poucos casos praticamente contingentes àqueles mesmos casos – ao explicar só a extrema-direita em Portugal, não posso dizer que os fatores que encontrei neste caso vão explicar todos os outros. Assim, conclusões estudos large-n são mais facilmente generalizáveis, desde que a amostra seja representativa e os dados cumpram determinados pressupostos (Field et al., 2012). Mas, como se focam num número reduzido de variáveis, produzem conclusões necessariamente simples e parcimoniosas, que, ao contrário de estudos small-n, falham em iluminar nuances e detalhes de contextos complexos. Ademais, como procuram formar leis, basta um ou alguns casos negativos (onde x se verifica, mas y não) para as refutar. Por isso, é mais correto estas leis assumirem uma forma probabilística e não determinística (‘é provável que y aconteça quando x existe’ em vez de ‘y acontece sempre que x existe’). É este o trade-off essencial entre os métodos qualitativos e quantitativos. 

Para concluir esta discussão já longa sobre métodos, é importante dizer que independentemente de qual seja, a análise percorre geralmente três passos (Quivy & Campenhoudt, 1998). O primeiro é a apresentação ou descrição dos dados recolhidos, de forma consistente com o que ditaram as variáveis ou conceitos para que outros possam refutar ou replicar a nossa recolha de dados. O segundo é testar, medir ou analisar a relação entre as variáveis ou conceitos conforme ditam as hipóteses. O terceiro é comparar as relações observadas com as relações teoricamente esperadas, discutir estes resultados e daí retirar conclusões, respondendo à pergunta de partida.

 

Conclusões

Na secção final do trabalho deve ser feito um resumo do mesmo. Começa-se com a reafirmação do objetivo do artigo, ou pergunta de partida, breve resenha da teoria e das hipóteses que se quis testar, e, de seguida e mais importante, um resumo do que se descobriu, i.e., das inferências e conclusões do estudo.

 

Há ainda três elementos adicionais que enriquecem esta etapa ou secção. O primeiro é a discussão de como as conclusões do artigo se relacionam com conclusões prévias da literatura. Aqui deve-se referir o que o artigo trouxe de novo ao conhecimento existente, se confirma ou rejeita determinado entendimento, se completa determinado autor ou trabalho, etc. O segundo é a discussão de problemas e limitações do artigo. Esta honestidade intelectual ajuda a balizar e limitar as conclusões da investigação e torna o artigo não só mais fácil de refutar, como também mais resistente à refutação porque tem consciência dos seus limites. O terceiro é apontar para futuros caminhos de investigação sobre o tema. Que perguntas sobre o tema permanecem a que este artigo não conseguiu responder? Que perguntas novas é que esta investigação levantou? Isto torna mais fácil para outros investigadores construir conhecimento cumulativo com o conhecimento que o autor gerou.

Diogo Machado

MA Student of International Relations: Global Governance and Social Theory

University of Bremen & Jacobs University

Referências

Bennett, A. (2004). Case Study Methods: Desing, Use, and comaprative Advantadges. Em D. F. Sprinz & Y. Wolinsky-Nahmias, Models, Numbers and Cases: Methods for Studying International Relations (pp. 19–55). Ann Arbor: University of Michigan Press.

 

Braumoeller, B. F., & Sartori, A. (2004). The Promises and Perils of Statistics in International Relations. Em D. F. Sprinz & Y. Wolinsky-Nahmias (Eds.), Models, Numbers and Cases. Methods for Studying International Relations (pp. 129–151). Ann Arbor: Michigan University Press

.

Creswell, J. W., & Creswell, J. D. (2018). Research Design: Qualitative, Quantitative, and Mixed Methods Approaches (5a edição). Los Angeles: SAGE Publications, Inc.

 

Field, A., Miles, J., & Field, Z. (2012). Discovering Statistics Using R (1st edition). London: SAGE Publications Ltd.

 

Gilbert, N. (2001). Researching Social Life. SAGE.

 

Goertz, G. (2006). Social Science Concepts: A User’s Guide. Princeton: Princeton University Press.

 

Hollis, M. (2003). Philosophy of Social Science. Em N. Bunninn & E. P. Tsui-James (Eds.), The Blackwell Companion to Philosophy (2nd Edition, pp. 375–402). Oxford: Blackwell.

 

King, G., Keohane, R. O., & Verba, S. (1994). Designing Social Inquiry: Scientific Inference in Qualitative Research. Princeton, N.J: Princeton University Press.

 

Mahoney, J., & Goertz, G. (2006). A Tale of Two Cultures: Contrasting Quantitative and Qualitative Research. Political Analysis, 14(3), 227–249. https://doi.org/10.1093/pan/mpj017

 

Popper, K. (1989). Em Busca de um Mundo Melhor. Lisboa: Fragmentos.

 

Quivy, R., & Campenhoudt, L. V. (1998). Manual de Investigação em Ciências Sociais (2nd Edition). Lisboa: Gradiva.

 

Ragin, C. C. (1994). Introduction to qualitative comparative analysis. Em A. M. Hicks & T. Janoski (Eds.), The Comparative Political Economy of the Welfare State (pp. 299–319). Cambridge: Cambridge University Press. https://doi.org/10.1017/CBO9781139174053.013

 

 

Van Evera, S. (1997). Guide to Methods for Students of Political Science. Ithaca: Cornell University Press.